Mentiras e verdades

Jack cuspiu a fumaça do cigarro para o alto e ficou vendo seu ventilador de teto espalhá-la pelo pequeno escritório.
O jornalista olhou para as fotografias e documentos em sua mesa e analisou a história que contavam.


Uma história de horror que poucos em Nova York levavam a sério. Uma história que finalmente iria provar a todos que as lendas urbanas à respeito dos esgotos da cidade eram reais.


Alguma coisa se escondia debaixo da cidade que nunca dorme. Algo antigo e que muitos desconheciam.


Três batidas de leve na porta tiraram Jack de seus pensamentos.


— Entre, a porta está aberta. — Ele sabia muito bem quem o visitava aquela hora da noite.


O velho de terno giz cinza e chapéu coco que entrou não parecia feliz, mas Will nunca parecia satisfeito com nada na vida.


Jack o conhecia apenas a alguns meses, mas apreciava a companhia do velho. Will o ajudara a encontrar muitas peças do quebra cabeça no qual trabalhava desde o começo do ano.


Poucos jornalistas das cidade levariam Will a sério porque ele era dono de um tabloide minúsculo famoso por só publicar histórias absurdas. Notícias sensacionalistas como “Aliens nos correios” e “O que não te contaram à respeito dos ladrões de túmulos do cemitério Greenland” eram o tipo de matéria com a qual o homem trabalhava.
Histórias absurdas, mas que Jack começava a se perguntar se não teriam um fundo de verdade.


— O que é tão importante que não pôde esperar até amanhã, Jack? — Will resmungou ao sentar na cadeira em frente à mesa.


— Eu consegui, completei o quebra cabeças. — O jornalista apontou para seus documentos. — Sua última dica me levou ao lugar certo e agora a polícia será forçada a agir.


A expressão no rosto de Will não se alterou. De alguma forma, ele nunca demonstrava qualquer tipo de sentimento.


— Seja lá o que estiver se escondendo nos esgotos desta cidade, vamos jogar um pouco de luz sobre eles.


— Você não parece tão feliz. — Will disse após um breve momento de silêncio. — Não era o que queria? Levar a verdade até as pessoas?


Levantando da cadeira, Jack caminhou até a janela e observou a rua vazia do lado de fora.


— A quanto tempo você já sabia de tudo? — Questionou sem nem olhar para o velho.


Silêncio.


Jack quase se virou para ver se Will ainda estava sentado na cadeira quando veio sua resposta.


— Suponho que você realmente encontrou todas as peças do jogo, mesmo as que eu não te entreguei.


— O segurança do metrô que relatou ter escutado sons estranhos no túnel da linha 2 na mesma noite em que a primeira criança desapareceu. Ele sumiu da face da terra semanas depois do incidente… Era você.


Jack se virou para encarar os olhos do homem. Will estava de pé, perto da porta da saída. O jornalista não deixou de notar o quão silencioso aquele velho podia ser.


— Eu e você sabemos o perigo que se esconde por aí, Jack. Precisei cuidar das minhas costas, assim como você terá que fazer daqui para frente.


— Você me ajudou e me guiou até aqui. Qual é o próximo passo? Para quem revelamos tudo o que descobrimos?


Will, pela primeira vez, deixou sua máscara apática quebrar. A tristeza que Jack viu em seus olhos era de partir o coração.


— Agora nós escondemos a verdade e torcemos para que ninguém mais tenha que saber as coisas que sabemos. — Ele disse, colocando as mãos dentro do bolso do terno.


Jack riu.

— Nem todo mundo está pronto para lidar com o que eu e você esbarramos. Eu e alguns outros fazemos o que podemos e gostaríamos da sua ajuda, Jack. No entanto, esta não é uma guerra pela verdade. Se vier comigo, prometo que vai entender tudo.


— Você sabe muito bem que não posso fazer isso. Nunca vou deixar de levar a verdade para as pessoas, isso é a coisa certa a se fazer.


— Às vezes a mentira é uma arma tão pura e necessária quanto a verdade. — Will disse e ficou quieto.


O silêncio voltou a separar os dois até que Jack decidiu acabar com tudo.


— Se achou que eu iria me juntar a você e seu clube de segredos, se enganou. Vou fazer o que você não teve coragem de fazer, Will. Acho que não temos mais nenhum negócio para tratar.


Will foi embora com o gosto amargo da derrota na boca. Entrou no carro que esperava por ele e cumprimentou a mulher no banco do motorista.


— E o recruta? — Ela perguntou assim que ele entrou e se acomodou.


— Somos só eu você, Lara. — Will respondeu e então guardou um envelope pardo no porta-luvas.


Lara quase perguntou o que eles fariam com o jornalista Jack Kennett, mas então ela viu a fumaça saindo da janela do escritório e se calou.


O som do motor do carro abafou os gritos das pessoas no prédio quando as chamas cresceram e destruíram tudo o que tinha no pequeno escritório do jornalista.

* * * FIM * * *


Este conto é inspirado no jogo de rpg Delta Green. Um jogo sobre investigadores de horrores sobrenaturais que arriscam sua vida e sanidade para nos proteger de horrores que já estão na terra sem que ninguém saiba disso. Saiba mais sobre Delta Green no site da retropunk!

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