Dereck olhou para o visor em seu celular e depois deu uma boa olhada no terreno ao seu redor. Não eram os prédios e comércios destruídos que o preocupavam, nem os eventuais tremores no chão, os pterodáctilos radioativos sobrevoando o céu também não eram novidade e ele não dava a mínima para o cheiro esquisito que saia do bueiro perto do pneu de sua moto.
Não, nada daquilo afetava seus nervos. Pelo menos não mais. O que realmente o preocupava era que o sinal lhe dizia que seu alvo iria aparecer em algum lugar dentro da loja de Donnuts do Jeff Wolf.
— Merda, a semana mal começou e já tirei a carta premiada do azar! — Ele resmungou e levou um cigarro à boca.
Então se lembrou que não tinha mais seu velho isqueiro e trocara sua última caixa de fósforos por um bolinho de chocolate no bairro dos goblins vermelhos. Se não tivesse gostado tanto do bolinho provavelmente estaria se xingando naquele momento.
Dentro do Jeff Sugar o som de berros e rugidos chamou sua atenção e ele conseguiu ver um brilho esverdeado intenso escapar pelas janelas sujas. Seu alvo havia aterrissado em segurança no único território de lobisomens que existia na costa leste e Dereck era alérgico a pelo de lobisomem.
— Bom, suponho que seja hora do show. — Ele resmungou e preparou sua pistola para a ação.
Ele não pretendia atirar em nenhum lobisomem, mas provavelmente teria que acertar um tiro ou dois no imbecil que acabara de chegar na sua dimensão. O lugar que os habitantes chamavam carinhosamente de Dimensão 9 o “Cantinho do castigo dos salvadores da terra”.
Veja bem, a terra sempre esteve em perigo de ser destruída e sempre seria assim. Em algum lugar da criação um tipo diferente de ameaça surgia para apagar o planeta dos humanos da face do universo: Apocalipse zumbi seguido de apocalipse nuclear? Confere. Invasão espacial? Confere. Virar lanche de algum demônio antigo e imortal? Confere diversas vezes!
Só que para cada ameaça existia um time de heróis decididos a fazer de tudo para evitar o caos. Mesmo quando esses heróis falhavam alguns deles, como Dereck e seus amigos já haviam feito no passado, conseguiam a proeza de voltar no tempo para tentar salvar a terra mais uma vez. Hoje ele conseguia ver que aquilo devia ser algum tipo de doença cósmica, às vezes o melhor a se fazer era cruzar os braços e deixar o apocalipse acontecer.
Por que Dereck pensava assim? Um motivo muito simples. Viajem temporal era uma merda e a criação nunca se livra realmente do futuro apocalíptico do qual um viajante temporal pensa estar apagando com seu ato de heroísmo.
Resquícios daquelas realidades horríveis sempre ficavam para trás, como os registros de um programa de computador deletado que insistem em jamais ir embora do sistema operacional. E onde toda aquela bagunça ia parar?
Justamente na dimensão onde Dereck vivia agora, junto de outras centenas de imbecis como ele que iam parar ali por causa de algum castigo cósmico. Exatamente como o caso do infeliz que havia acabado de se materializar no meio de um bando de lobisomens.
Vinte anos foram necessários para convencer aqueles monstros a parar de tratar todos como lanche e a integrar a curiosa sociedade da dimensão 9, cujo lema era “Zumbi, vampiro, demônio, humano ou seja lá o que você for… Bem-vindo! Trate o coleguinha com um mínimo de respeito e não vamos te desintegrar”.
Aquela paz estava funcionando e, a não ser que ele conseguisse impedir que o “herói” recém chegado matasse algum lobisomem dentro do Jeff, tudo iria pelos ares de novo.
— Muito bem, pessoal! Todo mundo calmo! — Dereck anunciou sua entrada ao chutar a porta e apontar sua pistola para o homem de sobretudo negro e Katana na mão. Ele espirrou alto duas vezes e pediu desculpas. — Merda de alergia…
O imbecil de sobretudo o encarou. Ele trazia aquela cara de durão mal encarado padrão que vários heróis adoravam sustentar. Analisando seu alvo, Dereck sentiu vergonha alheia só de recordar de um tempo onde ele se comportava exatamente daquela forma.
Um dos lobisomens no restaurante, vestindo roupas sociais feitas sob medida para sua espécie, retirou um lenço do bolso e lhe ofereceu com um olhar de simpatia.
— Agradecido. — Dereck limpou o nariz que já começava a coçar na ponta.
Sem entender nada do que via, o recém chegado resolveu tentar assumir o controle.
— Se acham que vou cair sem uma luta estão muito enganados. — Disse em um tom sombrio e, que na cabeça dele, devia ser ameaçador. — Eu sou o…
— Você é Batman ninja da terra 22 e precisa retornar o mais rápido possível para o salão da sociedade da justiça, ninguém te avisou que Amalgama foi uma série horrível e que devia ter parado de assistir Supernatural na segunda temporada! — Dereck o cortou.
— O que? — O sujeito ficou confuso com o bombardeio de aleatoriedades.
Confuso por tempo suficiente para Dereck acertar um tiro na espada dele, arrancando-a de sua mão. Sem perder tempo, ele apontou a arma para a cabeça do homem que ainda tentava entender como havia sido desarmado daquela forma humilhante.
— Não damos a mínima para quem você era, amigo. — Explicou, percebendo que também parecia um tanto ridículo com o cigarro apagado na boca. — Agora você é o mais novo cidadão da dimensão 9, seja bem-vindo! Estou aqui para te dar a cartilha de apresentação e para te ensinar o essencial para facilitar sua nova vida por aqui. Que tal me acompanhar em um café? Ah! Por acaso você teria um isqueiro ou fósforo?
— Como é? Quem diabos é você? — O mal encarado questionou, fechando os punhos.
— Não ouviu uma só palavra do que eu disse, né? O dia vai ser longo. — Dereck sentou em uma mesa e fez sinal para um dos lobisomens. — Se importa de me trazer uma caixa de donnuts e café? Vou precisar de um pouco de açúcar no sangue para lidar com o esquentadinho ali.
Ignorando completamente o clima de tensão, os lobisomens voltaram a seus assuntos do dia. Vários deles apenas queriam terminar suas refeições em paz enquanto discutiam sobre o último jogo da liga de magos Vs guerreiros do fim de semana. Um dos lobisomens caminhou para a cozinha e foi atrás do pedido de Dereck.
— Ficar de pé não vai te trazer respostas, amigo. — Ele disse ao recém chegado.
Finalmente percebendo que ninguém ali queria uma briga, o homem sentou.
— Onde eu vim parar?
Dereck sorriu e esticou um folheto para ele. Quando seu pedido chegou à mesa ele pegou seu copo de café e disse.
— Começa a ler, novato. Só vou tirar suas dúvidas depois que terminar e nem um segundo antes. Você vai gostar de algumas coisas e detestar outras, mas as coisas são assim na dimensão nove.
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